Para Descontrair… Crônicas do Dr. João Baptista
Série: Cidadão do Mundo – Seu Passaporte para a Liberdade Financeira
Na inocência de um mero ocidental na Índia, ao que um tuk-tuk (carrinho prático de 3 rodas, universal por aqui) buzinou para nós assim que saímos de casa, eu me virei e o vi.
Ele perguntou aonde queríamos ir. Eu disse: “ – Lake Fateh.” Ele meneou com a cabeça, num sinal afirmativo que eu obviamente não consigo repetir e mandou subir.
O pequeno bando de cães amarelos de pelo curto que moram logo no final da via dos ferreiros, estava lá. Metade descansando nas ruas, outra metade em cima dos carros.
Ele buzinou. Todos levantaram a cabeça, e os que estavam mais ao meio da rua, se moveram para o lado, dando passagem. Nós não havíamos nos deslocado nem 100 metros.
Na subida em frente à mesquita, a rua se estreita. Buzina de novo! Em resposta, vários buzinam.
É uma sinfonia acústica caótica. São muitos tons. Inúmeras maneiras de anunciar que estamos passando antes do ponto cego da curva. Esposa aperta minha mão. O zelozo motorista sorri e diz que está tudo bem.
Agora a curva leve à direita, existem alguns burrinhos carregando areia, no meio da ponte que atravessa o Lago Swaroop, não há área de escape e nem acostamento.
Outra buzinada e os animais abrem passagem e a sua condutora, com seu colorido sari e o cajado, aponta para os pedestres logo à frente, também se afastarem.
Receba Informações do Mercado Financeiro em Tempo Real. Entre para nossa Comunidade no Whatsapp!!!
Olhei para a água e os patos grasnaram de volta. Respondendo à sonora comunicação. Aí não resisti e perguntei: “ – Por que o senhor buzina tanto?” A resposta foi cartesiana. “Eu buzino, logo existo.” Não me surpreendi com o filosófico comentário visto que todo indiano é um pensador em potencial.
Saindo da ponte tem um lixão que pelas manhãs, quando passamos correndo, um grande trator recolhe os excessos. Corvos, gaviões e uma pequena família de uma mãe e três filhos estão sempre por ali.
Nova buzinada, agora mais demorada, pois ele explica que não se sabe o que pode vir do outro lado, ultrapassando a caçamba. Ah, o trânsito aqui é – teoricamente – de mão inglesa.
Um grande e luxuoso hotel está a 50 metros dali. Uma subida. Não tem nada e nem ninguém. Eu tinha certeza absoluta de que ele iria pressionar o botão enorme no meio do volante: – Foooooom! Fooom!
Numa calma e tranquilidade peculiares aos daqui, ele explicou que alguém poderia estar descendo muito rápido e ele assim estaria avisando que estamos passando.
Logo à frente vários tuk-tuks estacionados. Ele os cumprimenta com um aceno e uma buzinada cordial. Todos retribuem o gesto (ambos: aceno e buzinada).
Não há como não rir, e nem como explicar. Mas é assim mesmo. Agora vamos passar por uma região sombreada por árvores enormes e entrar na avenida que dá na entrada do Lago Fateh. Ele não olha, não freia, não desvia. O que ele faz? Adivinhem? Buzina. E tudo bem.
Agora são duas avenidas. E o caos se estabelece. É uma competição sonora e eu creio que a do nosso condutor é a mais alta e potente, o que nos faz ir adiante, apesar dos milímetros que nos separam das motos, caminhões, carros, bicicletas e pedestres.
Ele é muito hábil. Desvia com graça e precisão. E buzina com sofreguidão.
As margens do lago, ele faz um zigue-zague entre as charretes, os cavalos imaculadamente brancos e os gigantescos dromedários. Todos são saudados com buzinadas eloquentes.
E então chegamos ao ponto onde iremos descer para nadar. Quando eu digo que vim para cair n’água ele fica numa alegria tamanha que quase esquece de cobrar e ao ver meus colegas de natação me saudando se despede com seu passaporte natural: “- Fom-fom!”.
Buzina na Índia é antes de tudo, uma forma de comunicação.



